Yukie Hori + Inês Bonduki

Home > Coleção > Yukie Hori + Inês Bonduki

Inês Bonduki, São Paulo, SP, 1984. – Vive e trabalha em São Paulo.

Yukie Hori, São Paulo, SP, 1979. – Vive e trabalha entre Tóquio e Chiba, Japão.
Indicada ao Prêmio PIPA 2020.

Em fevereiro de 2018, Yukie recebeu de Inês um e-mail com o inusitado convite: criar duplas de imagens simultâneas de São Paulo e Tokyo, combinando os horários pelo WhatsApp. Sua ideia inicial, era aproximar imagens com temporalidades próximas mas espacialidades distantes. No decorrer do desenvolvimento do projeto, o processo foi adquirindo outros ritmos, novos contrastes, múltiplos encontros e conversas. Experimentando formas e edições, o farto material acumulado durante o diálogo visual entre as artistas foi condensado em 10 painéis verticais produzidos especialmente para a coleção do Instituto Pipa.

Sobre as artistas:
Inês Bonduki é fotógrafa, artista, professora e pesquisadora. Arquiteta pela FAU-USP, e doutora em Artes Visuais pela ECA-USP. Se interessa pela fricções entre experiência, corpo, deslocamento e imagem. Tem trabalhos expostos e publicados no Brasil e no exterior, e recebeu os prêmios Conrado Wessel, Foto em Pauta, dentre outros. Vive em São Paulo, mas gosta de se conectar com lugares distantes.

Yukie Hori é artista visual, designer gráfica e pesquisadora. Bacharel e mestre em Artes Visuais pela ECA-USP e doutora em Artes Visuais pela Tokyo University of the Arts, Japão. Acredita ser uma artista-ensaísta-zuihitsuka, que de maneira errática, investiga temas de interesse variados, testando diferentes soluções plásticas que tensionam a relação entre espaço, tempo, narrativa, recepção. Participa de exposições e residências artísticas nacionais e internacionais e recebeu os prêmios “V Prêmio Diário Contemporâneo de Fotografia” (2014), “VI Prêmio de Artes Plásticas Marcantonio Vilaça e Rede Nacional Funarte” (2011), UNESCO – Aschberg Bursary Program for Artists (2011), entre outros. Vive no Japão desde 2015, mas está em constante contato com o Brasil.


Projeto expositivo “De noite penso no dia, de dia penso na noite / 夜は昼を思い、昼は夜を思う(Yoru ha hiru wo omoi, hiru ha yoru wo omou)”. Vista geral da sala.

Enquanto Inês tirava fotos em caminhadas noturnas por São Paulo, Yukie fotografava um dia ensolarado no parque Ueno. Seguindo esse simples procedimento diário em lugares opostos do planeta, Inês e Yukie trocaram imagens de março de 2018 a junho de 2020, permitindo o encontro de temporalidades dicotômicas: noite de verão brasileira e dia de inverno japonês, dia brasileiro de outono e noite de primavera japonesa. 

“De noite penso no dia, de dia penso na noite / 夜は昼を思い、昼は夜を思う(Yoru ha hiru wo omoi, hiru ga yoru wo omou)” revelou diálogos visuais possíveis ou improváveis em justaposições poéticas de imagens de cotidianos diversos: olhares, lugares, climas, assuntos, luzes.

Buscando uma maneira concisa de apresentar o diálogo visual de 2 anos e meio entre Inês e Yukie, o projeto de exposição propõem um conjunto de dez kakejikus ou rolos suspensos. O kakejiku é um suporte tradicional para pintura ou caligrafia japonesa e é geralmente exibido no tokonoma, uma alcova no interior de uma casa japonesa especialmente destinada à visualização de objetos preciosos.

Com exceção do primeiro (caligrafia do título do trabalho de autoria do reverendo Kōbun Yamagishi, abade do templo budista Taineiji) e do último (pandemia), cada rolo apresenta um grupo de imagens tomadas em um mesmo dia e duas estações do ano opostas.

A escolha pelo kakejiku como suporte do trabalho se deu por duas razões: a
verticalidade, que se relaciona com a rolagem de mensagens instantâneas trocadas cotidianamente entre as artistas; e a portabilidade, semelhante à do livro, ao permitir ser enrolado para armazenamento e transporte.

PIPA de perto: a artista fala na coleção do Instituto

Além do texto acima, a participação de Yukie e Inês no PIPA de perto também contou com uma pequena entrevista com as artistas. Confira abaixo:

Quais critérios vocês usaram para selecionar, entre tantas, as imagens que foram para os kakejikus?

Inês: Cada rolo representa as imagens trocadas durante uma estação do ano, por exemplo, inverno no Japão 2019/verão no Brasil 2019. Dentre as imagens produzidas nessa estação, escolhemos conjuntos que gostamos mais (quatro imagens do mesmo dia) a partir de critérios diversos e subjetivos, como a harmonia entre elas, a memória de uma situação vivida, um momento histórico importante etc. As imagens que entram pequenas [nos kakejikus]são mensagens trocadas entre nós via WhatsApp durante essa estação.

Nesse processo de diálogo entre espacialidades distantes, além das temporalidades, quais foram os pontos de conexão que vocês perceberam? E quais foram os de afastamento, além do espaço físico?

Inês: Para mim, foi muito marcante a transformação da minha percepção em relação a meu próprio cotidiano. Comecei a ver o Japão em tudo. Na minha casa descobri um chinelinho e uma abóbora japoneses; andava na rua e notava as pessoas japonesas se multiplicando ao meu redor. Com o passar do tempo, o olhar da Yukie (que chegava com as imagens) começou a me contagiar: sinto que aprendi com ela uma forma de ver divertida e delicada, e que nossos olhares foram se aproximando. Com o passar do tempo produzia imagens para ela em diálogo com as imagens que haviam chegado.

Yukie: No começo do projeto eu sentia a necessidade de mostrar à Inês minha vida no Japão, então buscava retratar detalhes culturais mais característicos, como ter algum texto na imagem ou ter algo que remetesse a religiosidade japonesa. Ao mesmo tempo, sentia uma certa dificuldade em fotografar meu cotidiano: “o que fotografar se hoje não há nada visualmente interessante…”. Mas como o tempo, inspirada pelo olhar de Inês, fui entrando no projeto.

Sentimos o afastamento na edição das imagens. Esse processo seria muito mais prazeroso e dinâmico se pudéssemos estar juntas off-line, colocando as imagens impressas sobre uma mesa, enxergando a visão geral da sequência. Fizemos isso só uma vez, quando estive no Brasil. Mas boa parte da edição foi remota, trocando PDFs e compartilhando telas.

Vocês têm alguma história do processo do trabalho para compartilhar, como dificuldades na realização ou algum episódio específico que aconteceu nessa rotina diária?

Yukie: Tem um episódio engraçado: um dia recebi da Inês uma mensagem no Whats App: “UK! Acabei de chegar…”. E misturado ao assunto referente ao projeto (estávamos planejando uma exposição naquela época), eu inseria comentários com referência à Inglaterra. E ela respondia tudo com algum estranhamento. Depois de alguns dias perguntei que horas eram para ela e a resposta foi na mesma chave rotineira das 12 horas de diferença entre o Brasil e Japão. Nessa hora “caiu-a-ficha” de que ela não estava na Inglaterra e que aquela mensagem inicial foi um erro de digitação. “UK” era na verdade “YUK”.

Outra “dificuldade” foi minha adequação ao fuso de Inês: eu sempre errava o dia e horário das nossas chamadas por vídeo porque eu continuava com o hábito de pensar o tempo como quem do Brasil vai falar com alguém no Japão, algo bastante rotineiro na minha vida em SP, e eu sempre começava a chamada 12 horas antes…

A comunicação online é um fator basilar de nosso projeto. E comparando nosso tempo com os anos 80, um professor japonês, relembrando uma viagem ao Brasil, comentou como era difícil telefonar para o Japão ou enviar os rolos de filmes, que levavam meses para chegar ao destino. Apontando a atualidade de nosso processo, ele ainda notou que, de alguma maneira, estávamos antevendo o modo de trabalhar predominante na pandemia.

Vídeo produzido pela Do Rio Filmes, exclusivamente para o Prêmio PIPA 2020:
Para saber mais sobre NOME, acesse seu perfil completo no site do Prêmio PIPA.